Além de responder a pergunta proposta no título do post, farei alguns desabafos. Sendo assim, me desculpem antecipadamente. Entretanto, creio que esses desabafos são importantes e podem render alguma discussão. Se puderem, leiam com calma.
Fazem a pergunta proposta no título muitas vezes para mim, seja em atendimento a alunos ou em conversas informais com pessoas curiosa sobre minha profissão. Antes de explicar, relembro um vídeo com uma participação minha no Programa da Eliana, em que o Daniel faz uma brincadeira com o heliógrafo (instrumento utilizado para medir o número de horas de brilho solar e que possui uma esfera de vidro característica):
Claro que o Daniel fez apenas uma brincadeira. Como eu, ele é um cientista e sabemos que a meteorologia é uma ciência. Toda ciência possui metodologias, que são modos padronizados de se fazer a mesma coisa. Qualquer cientista da área de meteorologia pode questionar o método e pode propor novos métodos. Os cientistas então participam de conferências e seminários, onde apresentam a outros cientistas seus trabalhos. Esse procedimento é feito em diversas áreas do conhecimento.
Esse procedimento diferencia a ciência da crença. Em ciência, qualquer pessoa pode questionar os resultados, refazer os experimentos, propor novas técnicas e novas maneiras de observar e resolver um mesmo problema. Nas crenças, existem os dogmas: não há como provar, deve-se apenas crer.
Estou dizendo essas coisas antes de falar sobre a previsão do tempo pois na última sexta feira eu assistia o programa da Ana Maria Braga. Diversos místicos apareceram no programa falando sobre as previsões para o ano de 2012. Por místicos, entendam astrólogos, tarólogos, mães de santo e outros advinhos. O que me chamou a atenção é que muitos desses advinhos disseram que iria chover muito no mês de janeiro nos Estados da Região Sudeste do Brasil. Mas isso é fato! Não é necessário possuir nenhum poder sobrenatural (se é que tal poder existe) para prever isso. Sabemos, através da observação sistemática da natureza que o mês de janeiro é o mais chuvoso na Região Sudeste do Brasil.
Após as supostas previsões destes advinhos, ainda no programa de Ana Maria Braga, a apresentadora resolve chamar um meteorologista para falar sobre as previsões para as chuvas no verão. Então entra em cena um competente colega de profissão chamado Giovanni Dolif que ‘confirma’ o que foi dito pelos adivinhos.
Veja, coloquei ‘confirma’ entre aspas porque esta foi a intenção do programa, de acordo com meu ponto de vista. Colocaram ciência e crença no mesmo patamar, quando são coisas totalmente diferentes! Vejam o vídeo (se quiserem) e tirem suas próprias conclusões.
A ciência mais uma vez foi colocada como descrédito na televisão. E para completar, hoje (02/01/12, quando comecei a escrever) vi na Record (e em um programa jornalístico) mais um alarde sobre o suposto fim do mundo*. No meio do alarde, falaram algo como: “para completar, este ano é bissexto”. Explicamos aqui por que o ano bissexto é necessário! Não há nada de sobrenatural ou inexplicável neste fato, é apenas uma necessidade do calendário. Felizmente colocaram um astrônomo (cujo nome não consegui anotar) para falar sobre o fim do mundo (ele falou sobre a evolução do Sol), mas o cientista teve pouquíssimo tempo para falar sobre isso e explicar melhor para a população.
Desculpem enrolar tanto para falar sobre o assunto (até pensei em quebrar este post em dois), mas eu realmente fico indignada. Ciência é uma coisa e crença é outra! Isso precisa ser deixado muito claro. Peço aos professores que leem meu blog: ensinem seus alunos a pensarem com lógica, a questionarem. O mundo precisa de pessoas assim, precisa de gente crítica e que faz muitas perguntas. Não de gente que acha que já tem as respostas prontas.
Após este desabafo, começo a falar sobre o tópico: Como é feita a previsão do tempo?
Para fazer a previsão do tempo, é necessário antes conhecer o estado atual da atmosfera. Quanto melhor conhecermos o que está acontecendo agora, melhor será a previsão do tempo. Como conhecer o estado atual da atmosfera? Através de observações sistemáticas. Essas observações sistemáticas são feitas utilizando alguns instrumentos e técnicas, veja nos tópicos a seguir:
1) Estações Meteorológicas de superfície: Em Estações Meteorológicas de Superfície, são feitas observações de temperatura, umidade relativa, pressão, chuva, vento, radiação solar e nebulosidade (tipo e quantidade de nuvens). As observações e medições são feitas diariamente, sempre seguindo uma mesma metodologia científica. Os instrumentos são manuseados com cuidado e em caso de mau funcionamento, a manutenção é feita e caso seja necessário, o instrumento é trocado por um previamente calibrado. Para conhecer os principais instrumentos de uma estação meteorológica, clique aqui.
2) Radiossondas: radiossondas são balões acoplados a sensores (que medem temperatura, umidade relativa, vento, pressão, etc). O balão sobe, enquanto faz um perfil vertical da variação de todas essas variáveis da atmosfera. Essas informações são transmitidas via rádio para uma base. Radiossondas são mais normalmente lançadas em aeroportos.
3) Satélites meteorológicos: Depois da década de 70, com maior difusão dos satélites para uso civil, a previsão do tempo ganhou muito em qualidade. Através dos satélites, é possível ter informações meteorológicas sobre todas as partes do planeta, principalmente onde não há estações meteorológicas de superfície ou radiossondas.
4) Radar Meteorológico: são utilizados para detectar nuvens e caracterizá-las, ou seja, ajudam a determinar a intensidade e o tipo da precipitação (garoa, chuva forte, granizo ou neve, por exemplo).
5) Bóias oceanográficas e navios: fazem o monitoramento da atmosfera sobre os oceanos
Navio Antares e bóia oceanográfica. Fonte: Marinha do Brasil (aqui)
6) Aviões: diariamente, todos os aviões coletam dados meteorológicos durante seus trajetos.
Essas medições são feitas e ajudam a determinar o estado atual da atmosfera. Essas informações são então centralizadas (normalmente no órgão máximo de meteorologia do país, no caso do Brasil é o INMET – Instituto Nacional de Meteorologia).
Quem fornece todos os dados necessários para a previsão do tempo?
Dados de todos os locais do mundo são necessários para que uma boa previsão do tempo seja feita. A Organização Meteorológica Mundial (WMO, sigla em inglês para World Meteorological Organization) foi criada pelas Nações Unidas para coordenar todas as atividades científicas relacionadas ao tempo e ao clima. A WMO é composta por 187 países e territórios. A WMO centraliza todas as observações: os órgãos máximos de meteorologia de cada um dos países (no Brasil é o INMET – Instituto Nacional de Meteorologia) enviam os dados para a WMO. Esses dados correspondem a informações de aproximadamente 15 satélites, mais de 10 mil estações meteorológicas de superfície, cerca de 7300 informações de navios, além de centenas de dados de bóias oceanográficas e aviões.
Retirado de Lutgens, F.K e Tarbuck, E.J: The Atmosphere: An Introduction to Meteorology.
Essas informações sobre o estado atual da atmosfera são então inseridas em supercomputadores. Supercomputadores não são computadores comuns, do tipo que as pessoas tem em casa. São computadores com muita memória e capacidade de processamento, que podem realizar muitas operações de cálculo por segundo. Nesses supercomputadores estão instalados programas de computador desenvolvidos em universidades e outros centros de pesquisa. Esses programas também são chamados de modelos meteorológicos. A atmosfera, como tudo no Universo, segue as leis da Física (leis da Termodinâmica, leis de Newton, etc). Os modelos meteorológicos são feitos para resolver as equações das leis da Física, dizendo então como as variáveis meteorológicas se comportam no tempo. Conhecendo as condições iniciais (informações atuais sobre a atmosfera), é possível então fazer uma previsão das variáveis atmosféricas para as próximas horas, dias, meses, etc.
Supercomputador em operação no ECMWF (Centro Europeu de Previsão do Tempo a Médio Prazo). Veja mais aqui.
Porém, para descrever a atmosfera são necessárias muitas informações. A própria ocupação humana, por exemplo, cria novas informações (poluentes, mudanças no relevo, fontes de calor artificial, etc). Informações assim são difíceis de serem discretizadas, ou seja, de serem inseridas nos modelos meteorológicos. Por esta razão, a previsão do tempo não é exatamente precisa. Por exemplo, a temperatura máxima prevista para um determinado dia é de 30°C. Mas a medição desse dia confirma um valor de 32,0°C. Ou então, em outra situação, o modelo fornece previsão de chuva para a tarde de um determinado dia, porém chove na manhã daquele dia.
A previsão do tempo já melhorou muito com o advento de computadores mais rápidos e mais sofisticados e com a ampliação do uso dos satélites para fins civis. Você pode confirmar essa informação com pessoas mais velhas. A previsão do tempo se sofisticou e tende a ficar cada vez mais precisa e confiável, com a melhoria dos modelos meteorológicos (incluindo neles a atividade humana mais bem descrita, por exemplo) e com a melhoria dos próprios computadores.
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NOTAS:
*Não há nenhum fenômeno natural que ameace a integridade de nosso planeta e pretendo falar mais vezes sobre isso ao longo de 2012. Eu tenho certeza que este tema será abordado a exaustão ao longo deste ano e infelizmente temo que muitas pessoas ficarão preocupadas e desastres ocorrerão por causa desta ‘profecia’.
[…] Para finaliza o post, se tiver curiosidade e quiser saber como a previsão do tempo é feita, clique aqui. […]