Sei que a gente já está em Agosto e mês que vem o inverno do Hemisfério Sul acaba. Era para esse post ter saído antes, mas eu acabei falando sobre outros assuntos e deixei isso de lado.
Muita gente gosta de neve. Ela é realmente incrível e fofinha (assim que cai) e para nós brasileiros tem a magia da novidade. Se você perguntar para pessoas que moram em lugares onde costuma nevar todo o inverno, eles vão te dizer que neve é um horror, que tem que limpar a frente da casa, que dirigir é perigoso, etc. Mas para os moradores do Brasil, é lindo e mágico.
Nesse post, vou mostrar algumas cidades brasileiras onde a neve já foi registrada e porque essas cidades são tão privilegiadas quando o assunto é esse fenômeno meteorológico. Venham comigo e congelem:
Primeiro, o que é preciso para que tenhamos neve em uma localidade?
Para que ocorra neve em uma cidade, essa cidade precisa estar localizada em uma altitude elevada. Quanto maior a altitude do local, maior a possibilidade de neve. Mas o local também precisa ter uma quantidade significativa de umidade para que as nuvens de onde a neve vai precipitar se formem.
Claro, quanto mais distante da Linha do Equador, mais rigoroso será o inverno e maiores também as chances da ocorrência de neve. Se a gente somar os fatores (distância da linha do Equador + altitude elevada), maiores ainda as chances de ocorrência de neve.
É importante lembrar que a gente espera ter neve quando estamos no inverno. Não adianta a cidade ser favorecida em termos de latitude e longitude, conforme mencionamos anteriormente. É importante que seja inverno, porque é o período do ano em que temos menor incidência de radiação solar naquela região e quando consequentemente teremos temperaturas mais baixas.
Resumidamente, são esses os fatores que fazem uma localidade ter maiores chances de ocorrência de neve durante o inverno. Nesse post, eu explico como a neve se forma, para quem quiser saber mais detalhes sobre o que acontece dentro da nuvem.
Falando de São Paulo
Como vocês sabem, sempre acabo “puxando sardinha” para o Estado de São Paulo, porque além de ser onde trabalho, também são dados meteorológicos desse Estado (especificamente a cidade de São Paulo-SP) que eu tenho mais acesso. E como eu já disse em um post bem famoso daqui do blog, não há registros de neve em São Paulo-SP. Bom, pode até ser que aconteceu há muito tempo atrás, tanto tempo atrás que não temos registros escritos a respeito do fenômeno. Mas desde que se tem registros, a neve não foi observada e no post em questão eu falo inclusive sobre o famoso mês de junho de 1918, quando muitos afirmam que houve registro de neve, porém não teve nada disso e eu explico direitinho (corre lá pra ler).
Mas falando em Estado de São Paulo, vocês certamente sabem que o destino turístico de inverno mais famoso por aqui é Campos do Jordão e outras cidades da Serra da Mantiqueira. Por aquelas bandas já registraram neve, porque a altitude mais elevada da região possibilita isso. No entanto, faz muito tempo que a neve não aparece por lá. Nesse texto, são narrados registros históricos da ocorrência de neve em 31 de julho de 1928, quando até 20cm de neve teria se acumulado em alguns pontos de Campos do Jordão. Há relatos de galhos de arvore que se quebraram. Na época, a cidade tinha apenas cerca de 5000 habitantes, portanto não era nada parecida com o badalado destino de inverno dos dias de hoje.
Aparentemente, o registro de 1928 não é o único registro de neve na cidade. Há registros de neve nos longínquos anos de 1892 e 1896, além de neve em 27 de julho de 1964, quando a mínima atingiu -8,0°C {x}. Inclusive no ano de 1964 foi a última vez que o fenômeno foi registrado na região.
Como vocês sabem, o aquecimento global e o chamado aquecimento local (ocorrência do fenômeno ilha de calor) fizeram com que as temperaturas médias fossem se elevando anualmente. A temperatura média mínima sofreu um impacto ainda menor e em outras palavras, as manhãs de hoje em dia não são tão frias quanto as de antigamente. Como exemplo disso, consulte o capítulo sobre temperatura do Boletim Climatológico Anual de 2017 da Estação Meteorológica do IAG-USP, onde é possível ver a elevação das temperaturas médias anuais, com maior impacto nas temperaturas médias mínimas anuais.
Se você conversar com moradores antigos da cidade de São Paulo ou até de outras cidades do Estado de São Paulo, eles vão te dizer que as manhãs eram mais frias quando eles eram mais jovens. Na minha infância, lembro de ter muito mais nevoeiro do que nos dias de hoje e a ocorrência de nevoeiro pelas manhãs tem a ver com a temperatura da superfície: manhãs com temperaturas mais baixas são mais sujeitas a ocorrência de nevoeiro.
Vamos falar do Brasil todo
Agora que falei especificamente do Estado e da cidade onde nasci e cresci, vamos falar de outras cidades do Brasil. Nosso país tem uma boa extensão norte-sul e possui vários tipos de climas. A Região Sul do Brasil tem mais chances de ocorrência de neve devido a sua latitude (está mais distante da Linha do Equador) e se a gente fizer ainda um recorte nessa região, vai poder observar que existe a Serra Gaúcha e a Serra Catarinense (Planalto Serrano). Essas duas serras meio que são a mesma formação (desculpem se cometi algum erro aqui, amigos geólogos e geógrafos, informem se o fiz nos comentários) e estão localizadas no sudeste de Santa Catarina e no nordeste do Rio Grande do Sul. No lado gaúcho, o ponto mais alto é o Pico do Monte Negro (1410m de altitude) e no lado catarinense o ponto mais alto é o Morro da Boa Vista, com altitude de 1827m. Foi inclusive no lado catarinense da serra (que em média é um pouco mais alto) que foi registrada a menor temperatura do Brasil (de acordo com registros não-oficiais), que foi de -17,8°C no Morro da Igreja, em 1996.
No entanto, é preciso deixar claro que esse valor não é a menor temperatura já registrada em termos oficiais. O valor oficial é aquele divulgado pelo INMET (Instituto Nacional de Meteorologia) registrado em estações meteorológicas certificadas pela OMM (Organização Meteorológica Mundial). Sendo assim, segundo o INMET, foi na cidade catarinense de Caçador (que fica mais a oeste do Estado, distante da Serra Catarinense) que foi registrada a menor temperatura (em registros oficiais) já observada no Brasil: -14,0 °C, em junho de 1952 {x}.
A questão é que temperaturas negativas são comuns no inverno nessa região da Serra Gaúcha e Catarinense. E claro, ter temperaturas abaixo de 0°C é um dos ingredientes para termos neve no local onde esse fenômeno pode acontecer pelos motivos mencionados.
De acordo com esse levantamento, das 10 cidades onde já tivemos registro de neve, 9 ficam na região da Serra Gaúcha e Catarinense. Além dessas 9 cidades, o levantamento conta com a cidade de Palmas, no interior do PR, onde neve também já foi registrada.
Chega a ser uma ironia a coincidência de uma cidade chamada Palmas ter neve. No caso estamos falando de Palmas-PR. Lembrando que Palmas-TO é uma cidade onde praticamente não se tem temperaturas baixas no inverno (já que fica muito próxima da linha de Equador, podendo inclusive ter máximas de mais de 35°C no meio do ano).
Eu fiz uma lista dessas 10 cidades onde podem ocorrer nevascas. Clique aqui para conferi-las e veja abaixo como elas ficaram dispostas em um mapa:
É importante observar que todas essas cidades estão em altitudes superiores a 900m (conforme a reportagem), além claro, de estarem distantes da linha do Equador. Portanto, se você gosta de neve e está programando sua próxima viagem nacional, essas cidades podem estar em seu roteiro turístico para o próximo inverno. Acompanhe a previsão do tempo diariamente durante sua estadia no inverno nessas cidades e você poderá ter a sorte de testemunhar esse encantador fenômeno em uma dessas localidades.
Leia a reportagem para saber a respeito de nevascas históricas que atingiram as cidades listadas acima e outras localidades vizinhas.
Bibliografia
Além dos links ao longo do texto:
- Matéria do UOL
- As neves de Campos do Jordão e Serra da Mantiqueira
- A ocorrência de neve em planaltos subtropicais: o caso do Sul do Brasil, Rodolfo Souza, dissertação de mestrado – FFLCH – USP
- Ocorrência de ondas de frio invernais em São Joaquim – Santa Catarina, Alves et al (2014)
Dicas de livros: Atenção!
Vou falar de um livro em português que é super recomendado para quem está iniciando seus estudos em Meteorologia. Meteorologia: noções básicas conta com um time de autores excelentes (Rita Yuri Ynoue, Michelle S. Reboita, Tércio Ambrizzi, Gyrlene A. M. da Silva), todos professores de cursos de Meteorologia de diversas regiões do Brasil.
Hoje, o jornal em qualquer mídia apresenta e explica a dinâmica meteorológica. Embora façam parte de um sistema complexo, os fenômenos meteorológicos são apresentados nesta obra de forma simples e didática, desde os conceitos básicos de composição e estrutura da atmosfera até a previsão do tempo e do clima e as mudanças climáticas. {x}
Outro livro bem bacana é o Geografia Aplicada ao Turismo, livro escrito por vários autores com organização do Raphael de Carvalho Aranha e do Antônio José Teixeira Guerra.
A obra apresenta uma abordagem ampla e integradora das ciências sociais e ambientais, numa perspectiva interdisciplinar, evidenciando a aplicabilidade da climatologia, geologia, geomorfologia, biogeografia, cartografia, geopolítica e cultura no Turismo, auxiliando esses profissionais a planejarem suas atividades turísticas, em escalas locais e regionais.
Todos os autores do livro são especialistas nas suas áreas e já vêm trabalhando há bastante tempo nos temas que se propuseram a escrever. Os sete capítulos abordam questões cruciais para a boa formação de um profissional em Turismo e para aqueles formados em Geografia que também se interessam pelo tema.
A grande quantidade de fotos, ilustrações, tabelas e gráficos pode auxiliar os leitores a entender melhor essas questões. A bibliografia apresentada também possibilita aos leitores se aprofundar em algum tema abordado no livro. O livro Geografia aplicada ao turismo pretende atender tanto a alunos de graduação como de pós-graduação em Turismo, Geografia e áreas afins, bem como a outros profissionais e ao público em geral interessado nessa temática. {x}
Geografia Aplicada ao Turismo é um livro muito indicado para profissionais da área do Turismo e Geografia. Se você viaja bastante, também é super recomendado! Confira!
E preciso indicar também dois livros de Climatologia, matéria essencial nos cursos de Geografia e Meteorologia (embora com abordagens diferentes). Indico Climatologia Fácil, de Ercília Torres Steinke. De acordo com o texto de divulgação:
O que faz a asa-delta voar? O que é o fenômeno El Niño? Como são formados os desertos? Qual a diferença entre furacão e tornado? Perguntas cotidianas, feitas por alunos e reunidas pela autora durante seus mais de 15 anos de experiência no ensino de Climatologia, servem como ponto de partida para explicar conceitos e fenômenos climáticos de forma prática e original.
Ricamente ilustrada, a obra utiliza exemplos práticos para explicar os principais conceitos da Climatologia Geral, como movimentos de rotação e translação da Terra, radiação solar, umidade, precipitação e circulação atmosférica. Ao final do livro, a autora discute o aquecimento global e as polêmicas que o envolvem, levando o leitor a refletir sobre esse importante tema.Climatologia fácil é uma referência prática e descomplicada para alunos de graduação em Geografia e Meteorologia e professores de ensino fundamental e médio, assim como todos aqueles interessados em conhecer mais sobre os fenômenos climáticos a partir de exemplos do nosso dia a dia. {x}
O próximo livro de Climatologia é o Climatologia: noções básicas e climas do Brasil. Os autores são Francisco Mendonça e Inês Moresco Danni-Oliveira. De acordo com o texto de divulgação:
Climatologia: noções básicas e climas do Brasil é uma obra de referência que reúne conceitos básicos de climatologia e meteorologia, com destaque para os domínios climáticos e sistemas atmosféricos que regem tempo e climas do continente sul-americano e Brasil.
Ao longo de sete capítulos, o livro traz um panorama sobre o clima e define didaticamente as diferenças entre climatologia e meteorologia. Iniciando com o ambiente onde ocorrem os fenômenos, analisa as propriedades da camada atmosférica com 10km de altura em torno da Terra e sua circulação. Mostra a dinâmica determinada por massas e frentes de ar na América do Sul.
O livro resgata o papel histórico das classificações, discute os modelos de classificação climática da Terra e apresenta os grandes domínios climáticos. Analisando as variações de temperatura e pluviometria ao longo dos anos, nas diversas regiões do País, define e apresenta os tipos climáticos do Brasil.
O livro reserva um capítulo final para falar sobre efeito estufa, desertificação, El Niño e La Niña, associados às mudanças climáticas globais.
Francisco de Assis Mendonça é mestre em Geografia Física, doutor em Clima e Planejamento Urbano. Atualmente é professor titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pesquisador do CNPq, consultor da CAPES e FAPESC. É professor colaborador do mestrado em várias universidades do País. Atua nas áreas de climatologia, epistemologia da geografia, ambiente urbano e geografia da saúde.
Inês Moresco Danni-Oliveira é mestre e doutora em Geografia Física. Atualmente é professora adjunta da UFPR. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Climatologia Geográfica, atuando principalmente em clima urbano, poluição do ar e saúde, acidentes climáticos, impactos socioambientais e variabilidade climática. {x}
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