Ontem eu assistia o programa Mais Você, apresentado pela carismática Ana Maria Braga. Uma das reportagens do programa falava sobre os escorpiões, que podem ser perigosos para os humanos. Eles se escodem em frestinhas, em meio a roupas e sapatos e podem picar, podendo a picada ser letal se a vítima for uma criança ou um idoso.
Achei a reportagem muito boa e explicativa. Um biólogo, Cláudio Maurício de Souza, foi consultado, mostrou o animal e falou um pouco sobre seus hábitos e habitat. Se alguém tiver interesse, o programa pode ser assistido aqui. Se não me engano, a própria Ana Maria é bióloga de formação. Acho que isso também deve contribuir para que pautas assim existam em seu programa.
O Igor, que é biólogo, confirmou: Ana é mesmo bióloga. E me mandou essa foto. Corri pra editar o post e adicioná-la rs. Que mulher carismática!
Mas por que menciono o programa? Em um determinado momento, o biólogo ouvido foi questionado sobre as causas da infestação de escorpiões. Ele falou que o desmatamento e o aumento da urbanização fez com que os escorpiões chegassem a grandes cidades. E ele também falou que as mudanças climáticas são outro fator para o aumento da infestação, já que com o aumento da temperatura, por exemplo, alguns animais podem se adaptar em regiões em que outrora não eram adaptados.
Há alguns meses fui na exposição Cabeça Dinossauro: o novo titã brasileiro (leia mais aqui). Um dos painéis chamou muito minha atenção. Ele mencionava as extinções em massa que ocorreram em nosso planeta. Há também esse link da UFMG sobre o assunto. Foram 5 as extinções em massa e estamos vivendo a sexta extinção nesse momento, em decorrência das alterações que fizemos no planeta: mudança da cobertura do solo, desmatamento, impermeabilização do solo, poluição e claro que todos esses pontos tem relação com as mudanças climáticas. Inclusive tirei uma foto do painel da exposição que mencionava exatamente essa sexta extinção:
“O ser humano é o principal agente do sexto evento de extinção em massa. Habitats naturais são destruídos, cedendo espaço para cidades, agricultura e pecuária. Entre 100 e 150 espécies são extintas diariamente (taxa mil vezes maior que a natural). Isto representa uma séria ameaça a sustentabilidade da nossa espécie na Terra”.
Por que menciono esses dois fatos? Menciono como exemplos, pois neles percebemos que biólogos e paleontólogos estão participando das discussões sobre mudanças climáticas. Já ouvi diversos biólogos falarem da perda da diversidade, do branqueamento dos corais, da presença de vetores de doenças tropicais em áreas não tropicais (com o aumento da temperatura, muitos insetos passam a conseguir viver em outros locais), etc. Várias ocorrências no mundo animal já mostram os efeitos das mudanças climáticas. E não dá para discutir mudanças climáticas sem pensar na poluição, na mudança da maneira de viver em muitos países ricos ou em desenvolvimento (aumento do consumo e aumento de habitantes em áreas urbanas, por exemplo). Todos esses assuntos estão relacionados.
Como muitos de meus leitores já devem ter observado, sempre que posso tento assistir palestras e discussões sobre mudanças climáticas. É um assunto pelo qual tenho interesse desde a graduação. Embora eu não esteja trabalhando diretamente com pesquisa no momento, já que sou da área técnica de uma universidade, gosto de ler sobre o assunto para divulgar ciência. Tenho percebido que os simpósios e workshops mais recentes sobre o tema não concentram apenas meteorologistas e outros cientistas do clima (físicos e matemáticos que também trabalham com modelagem numérica da atmosfera, por exemplo). Nesses eventos, vemos sociólogos, geógrafos, economistas, engenheiros, biólogos, agrônomos, jornalistas, etc. Toda a discussão ganhou um caráter multidisciplinar muito importante, que permite que possamos compreender as reais dimensões do problema e estudar possibilidades de adaptação.
Essa interdisciplinaridade me fez inclusive pensar nessa reportagem que li recentemente. Lá na Finlândia, as escolas aboliram a divisão de matérias. Para isso acontecer aqui e em outros lugares também, teria que haver uma mudança na formação do professor. Na minha opinião de leiga (não sou pedagoga), acredito que essa forma de aprender é o futuro!
Até a oitava série (na época chamávamos de ‘série’), eu estudei em uma Escola Padrão. Era uma escola pública diferenciada e de referência. Lembro que tínhamos “eixos temáticos”. Ao longo de um bimestre, um mesmo tema era abordado por todas as disciplinas. Por exemplo, houve um bimestre que o tema era Rio Tietê. Todas as disciplinas abordavam o Rio Tietê de alguma forma. A Matemática falava de seus números (vazão,comprimento,etc). Em Português, interpretávamos textos, poemas e músicas que abordavam o rio ou a poluição das águas. Lembro inclusive que muitas vezes os conteúdos das matérias se misturavam, se encaixavam. Inclusive o material de História e Geografia era muito parecido, de modo que em algumas ocasiões as professoras explicavam a matéria em conjunto. Foi uma das experiências mais interessantes que tive na vida, que só voltou a repetir-se nos últimos anos da faculdade, quando as disciplinas “soltas” de meteorologia, física e matemática começaram a se encaixar. Por isso acredito que esse método empregado lá na Finlândia é o futuro. Isso acabaria com aquela ideia de “eu odeio física” ou “eu odeio ciência”. O aluno passaria a compreender que todas as áreas do conhecimento estão relacionadas.
“Mudanças Climáticas” ou “Aquecimento Global” já são um tema bem difundido. Professores discutem com seus alunos, muitos pais já sabem da importância da preservação ambiental e da reciclagem, por exemplo. E há crianças que chegam em casa e ensinam seus pais! Acredito que estamos tendo sucesso na divulgação do assunto.
Claro que há ainda os redutos de pseudociência, na maioria das vezes motivados por interesses econômicos, como o lobby da indústria relacionada ao petróleo. Isso é muito forte lá nos EUA e como é um discurso propagado até por líderes religiosos, acaba chegando também aqui no Brasil. Mas eu tenha a impressão que esse discurso, pelo menos aqui no Brasil, está cada vez mais sufocado. A gente não ouve mais falar desse cara, por exemplo:
Ele está por aí, provavelmente dando palestras em alguma instituição obscura. Mas ele não aparece mais como antes. Lembram de uma época em que ele estava na TV direto, com seu sorriso fácil, comportamento sarcástico e problemas no conhecimento dos processos de transferência radiativa? Pois então, tá sumidão! Não estamos com saudade! Que continue assim, sumido, se for para propagar pseudociência.
A verdade é que com tantas evidências em diversas áreas do conhecimento e com tanto trabalho de campo e de modelagem, fica cada vez mais difícil ser negacionista. Gostaria que os negacionistas aparecessem para dizer que estavam enganados, mas talvez o orgulho impossibilite. Considero que na área de Climatologia, pelo menos aqui no Brasil, a ciência está vencendo a pseudociência. Por isso, continuem divulgando as pesquisas, continuem lendo e continuem se informando. Procure boas fontes de informação. Quanto mais a gente lê, mais a gente desenvolve o senso crítico e passa a separar melhor o que é bom e o que é ruim em meio a tanta informação.
A figura acima é um meme criado pelo Rodrigo, do Discurso Retórico. Se quiser compartilhar no Facebook, clique aqui.
Samantha Sam, interdisciplinaridade é tudo! Quando saí do mestrado, percebi que não sabia nada sobre os oceanos, mesmo sendo a principal condição de fronteira para a atmosfera. Então fui fazer meu doutorado em oceanografia, com o intuito de sanar essa lacuna de conhecimento. Lá me deparei com a paleoclimatologia. Foi a melhor coisa que fiz. Além de estudar os oceanos, tive que estudar também biologia, geologia, geoquímica… Descobri que, no estudo do clima, devemos considerar o sistema Terra como um todo, e hoje tenho a mente muito mais aberta para receber informações e críticas de profissionais de outras áreas, pois todas são importantes. Acho que estamos vivendo um momento de transição, rumo à interdisciplinaridade, como os cientistas naturais de antigamente. É claro que isso não significa que devemos ter um conhecimento superficial sobre tudo, mas sim que devemos aprender que tudo está interligado 🙂
Parabéns pelo blog!
Beijos
Apesar de ter entendido a crítica do geógrafo acima, também não concordo com ele. O clima está mudando, isso é fato. Temos extinções acontecendo em ritmo mais acelerado do que o “natural” e vemos os efeitos das mudanças nos últimos eventos extremos do clima.
Mas há uma crítica pertinente sobre o alarmismo e o sensacionalismo. Ninguém tá a fim de mudar de vida e deixar de consumir pra salvar o planeta. Tem gente que acha que se mudar a fatura de cartão de crédito de papel simples pra reciclado ela vai ajudar o planeta. E não é por aí.
As mudanças vieram, chegaram, se estabeleceram. É tudo culpa da raça humana? Tem eventos externos agindo? Sinceramente, acho que não importa mais, a única coisa que podemos fazer agora é nos adaptar para o que virá. O clima vai ficar cada vez mais severo, pessoas pobres continuarão a ser as principais vítimas, enquanto a classe média posta foto do urso polar nadando, reclamando das mudanças climáticas.
Eu não me preocupo com o planeta, pois ele sempre passou por mudanças e sempre se adaptou. E é óbvio que sou contra desmatamento e todo o tipo de degradação desenfreada. O problema é a sociedade mesmo.
Oi Lu, fico mais do que feliz de ver um comentário seu aqui. Aproveito para pedir um guestpost, um texto em que você fala sobre o seu doutorado e sua trajetória acadêmica em geral. Vou te mandar um e-mail reforçando o pedido =)
Abraços!
Samantha