Estou AMANDO que bem durante a época em que decidi ficar grávida, estejam ocorrendo essas discussões sobre o parto normal e sobre as taxas absurdamente elevadas de cesarianas no Brasil. Há alguns meses, como confidenciei para meus leitores, o excesso de informação estava me deixando insegura e ansiosa. Hoje percebo que estou ficando mais sábia, estou aprendendo a filtrar informações.
E esse aprendizado tem sido muito importante e muito especial. Como ‘cientista’, eu já estava acostumada a filtrar informações e a separar o joio do trigo. A gravidez tem me ensinado novos filtros, acredito que estou ficando mais questionadora e menos desesperada.
Eu diria que quase que diariamente os portais de notícias mais famosos publicam alguma coisa sobre gravidez e parto. Alguns portais inclusive contam com colunas semanais apenas sobre o assunto. Essa discussão toda é muito importante, porque inclusive o Ministério da Saúde já está se mexendo e estabelecendo normas, com o intuito de diminuir a quantidade de cesáreas desnecessárias e de estimular o parto normal.
E onde me encaixo em tudo isso? Começo dizendo que não sou ativista de coisa nenhuma. Já informei em outros posts da série que não sou a favor de partos em residências. Acredito que o parto (normal/natural ou cesariana) deve ser feito em um ambiente hospitalar, com a participação de uma equipe treinada e humanizada. O próprio ambiente hospitalar deve ser humanizado (e não apenas no que tange a partos: todas as especialidades precisam passar por humanização). O bebê precisa ser examinado pelo pediatra e outros especialistas, quando for o caso e também deve ficar com a mãe. A mulher é a protagonista do parto, mas o parto precisa ser feito num lugar adequado e com boas condições de higiene e com infraestrutura caso imprevistos ocorram. E a minha casa não é um ambiente que reúne essas condições.
Também acho que uma cesariana bem indicada salva a vida da mãe e do bebê. Minha mãe e meu irmão quase morreram durante o parto, já que meu irmão era um bebê muito grande (4,4kg). No caso dela, uma cesariana deveria ter sido feita, mas por inúmeras razões não foi assim. E o/a médico/a precisa ser honesto/a e ético/a, para recomendar a cesariana só quando necessário mesmo.
Mas daí entra uma questão feita por muitas mulheres: e se eu quiser ter uma cesária? E se for escolha minha, mesmo sem indicação médica? Bom, seu médico vai ter que te ouvir e depois te explicar porque sua escolha não é muito boa. Mas acredito que não pode te negar essa solicitação, mesmo achando equivocada. Eu tenho que pensar assim, já que defendo muito as liberdades individuais. E mesmo quando mencionei que não faria o parto em casa por vários motivos, não significa que eu ache que ninguém deva fazê-lo. Cada um sabe de si.
O que observo, conversando com pessoas da minha faixa etária (com ou sem filhos, que pretendem ou não ter filhos, etc) é que muitas me consideram corajosa por sonhar em ter um parto normal. O parto cesárea virou normal! Ou seja, muitos acham que sou corajosa porque quero passar por um procedimento fisiológico. Agora vou fazer uma comparação que talvez seja infeliz, que talvez faça muita gente rir e que talvez faça com que muitas pessoas me achem louca (não se preocupe, você será apenas mais um rs). Quando você quer ir ao banheiro, soltar aquele número 2 pós feijoada de fim de semana, você se considera corajoso ou você preferiria que as fezes fossem extraídas do seu organismo cirurgicamente?
Eu, Samantha, não gostaria de passar por cirurgias. Só que infelizmente o Cosmos não atende minhas vontades sempre. Talvez um dia uma cirurgia seja indicada para salvar minha vida. Essa cirurgia pode ser uma cesariana ou pode ser qualquer outra. Só que acho que NINGUÉM, em sã consciência, gostaria de passar por uma cirurgia. E deixa eu lembrar uma coisa que parece que foi esquecida por algumas pessoas com quem conversei: a cesariana é uma cirurgia! Na cesariana, cortam sua pele, seu músculo, sua banha e te cortam um órgão! Mas meu Deus, por que alguém acha que uma cesariana é melhor do que um parto normal, digo, eletivamente falando? Na minha cabecinha não faz sentido.
Essas coisas que estou mencionando para mim configuram uma cultura da cesariana, muitas vezes mencionadas por ativistas do parto normal/natural. Parece que de uma geração para a outra, as pessoas se esqueceram que ter filhos por parto normal é algo… normal? E mais uma vez, repito: cesarianas bem indicadas salvam vidas! Além disso, se você quiser passar por uma cesariana por vontade própria, é a sua escolha. Acho que esses pontos são muito importantes de ressaltar, porque muitas vezes o ativismo acaba produzindo um efeito contrário: mães que tiveram filhos por cesariana acabam sentindo-se mal ou sentindo-se “menos mães” por essa razão. Já li relatos de mães que tiveram sua vida sexual prejudicada e sofreram de depressão pós parto porque não tiveram parto normal.
Agora vamos a reportagem do Estadão que mencionei no post (essa aqui). Quem indicou ela pra mim foi minha prima Danuza. A propósito, minhas primas e amigas são tão lindas e tão participativas que sempre me marcam em textos/videos/etc sobre o tema. Beijos para todas =)
Na reportagem do Estadão, falam dos médicos que “somem” na hora do parto. As mulheres queriam parto normal e o médico não apareceu, apesar dos telefonemas e mensagens desesperadas. Sem querer defender os médicos e sendo muito realista: o médico do seu convênio raramente vai aceitar fazer parto normal. A não ser, claro, que você pague uma taxa de disponibilidade para ele, o que é ilegal de acordo com a ANS e não faz parte da cobertura dos convênios.
O médico do seu convênio vai preferir uma cesariana agendada. Porque é muito mais prático para ele: ele chega no hospital no horário marcado, faz a cirurgia e volta para o consultório, para atender mais pacientes.Como os convênios pagam pouco aos médicos, eles atendem vários pacientes no mesmo dia.
Minha opinião: não crie expectativas elevadas sobre a vida. Por que esperar que o médico de seu convênio vai agir de forma diferente? Talvez ele aja, mas muito provavelmente não.
Uma das moças na reportagem disse: “O plantonista disse que até faria meu parto normal, mas que eu ia sentir todas as dores porque ele não ia me anestesiar”. Se foi do modo como ela conta, a gente tem que pensar por que a anestesia foi negada? Por que o médico plantonista não era o médico que a acompanhou e não conhecia seu histórico muito bem (e ficou inseguro, com receio) ou simplesmente negou por negar?
Na reportagem, as mulheres narram que seus médicos “sumiram” durante o trabalho de parto, pois deixou de responder telefonemas e mensagens. Uma vez que o médico prometeu acompanhar o parto, recebendo por fora ou não, é óbvio que ele está erradíssimo em prometer algo que não pode cumprir. Eu, Samantha, prefiro então não confiar em médico nenhum e esperar pelo plantonista. Pode ser que o plantonista e toda a equipe seja composta por malas sem alça, mas se forem competentes e éticos, é o que me importa. Por isso estou pesquisando muito sobre o hospital onde pretendo ter meu parto. Estou lendo reclamações e elogios, fui conhecer as dependências do hospital, falei com profissionais do hospital, etc. Como fiz isso no começo do segundo trimestre, inclusive pretendo voltar lá antes do parto para fazer mais perguntas e confirmar mais uma vez a cobertura. Se o hospital é bem recomendado, suponho que os profissionais desse hospital tenham competência para atender bem as pessoas. E eu conto com isso!
E se tudo der errado? E se eu for atendida por um médico estúpido? E se me fizerem uma cesariana sem necessidade? Bom, meu companheiro e eu vamos brigar para que nada disso aconteça. E se acontecer, vamos brigar ainda mais. Entretanto confesso para vocês que apesar de entender que essas são possibilidades, eu não fico pensando muito nelas. Penso nas possibilidades boas, penso em me manter bem e positiva, para que esses sentimentos estejam presentes quando meu filho nascer.
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Acompanhem toda série A “Cientista” Grávida – A Série [minha saga pessoal rs] aqui.
Cesariana nem deveria existir como “opção” de parto, pra começar. Ela tem que ser um recurso utilizado em um caso extremo de risco. O nascimento de uma cria, seja na espécie que for, é um processo fisiológico, como vc disse no texto. Pra que envolver uma cirurgia, desrespeitar o ciclo do bebê, já que cirurgia com hora marcada vai contra ele? No documentário O Renascimento do Parto, que tinha de ser obrigatório, um dos médicos diz que procedimentos cirúrgicos em outros mamíferos, na hora do parto, fazem a mãe largar a cria. Somos seres humanos, racionais e tal, mas aquele contato inicial de mãe e cria no mundo animal é extremamente necessário nos primeiros momentos de vida.
Instituiu-se uma cultura de que parto é uma coisa que só pode acontecer numa sala de cirurgia. Os dados são muito alarmantes.
Países que aboliram a presença do médico na sala de parto reduziram as cesarianas, como a Inglaterra, onde até os bebês da família real nascem de parto normal. Reduziram também as episiotomias desnecessárias e dolorosas. Criaram um ambiente amigável pra mãe e abriram um leque com várias posições e métodos de parto. Minha mãe teve as pernas amarradas e passou por uma episiotomia dolorosa que ela sente até hoje. Foi só quando eu falei sobre violência obstétrica com ela que ela percebeu pelo o que nós passamos naquela hora.
Excelente comentário! Muitas mulheres nem se dão conta da violência obstétrica que sofreram. Minha mãe conta que as enfermeiras costumavam dizer “ah, ta reclamando de dor agora? não reclamou quando estava fazendo, etc”. Inclusive minha mãe é super quietinha (fala bem pouco mesmo, hehehe) e conta que não gritava de dor, acho que até com medo de ser mal tratada. Quando gente, se você está com dor, é natural reclamar!
Não digo uma sala de cirurgia, porque um parto normal não tem por que ser numa fria sala de cirurgia. Na minha opinião, deve ser num ambiente hospitalar sim, porém acolhedor. Uma sala aconchegante, por exemplo. Se tudo der certo, meu parto vai ser mais ou menos assim e vou poder narrar minha experiência. Acho que todo o hospital deveria ser repensado, para ser mais humanizado e mais acolhedor, em todas as especialidades.
Eu acredito na necessidade de um ambiente hospitalar porque há muitas intercorrências que podem acontecer durante um parto, fazendo com que ele não evolua da maneira esperada. Estando em um hospital, fica fácil deslocar os pacientes para uma área de UTI, se for necessário. E infelizmente muitas ativistas omitem esse ponto da segurança. Bom, pelo menos vejo dessa forma.
Adorei o texto. Acho ridículo qdo as pessoas dizem "meu médico", "meu gineco", "meu dermato" e outras tantos especialistas. É status de poder ter seu médico, aquele pra chamar de seu, as pessoas transformam tudo em mercado
Adorei o texto. Acho ridículo qdo as pessoas dizem "meu médico", "meu gineco", "meu dermato" e outras tantos especialistas. É status de poder ter seu médico, aquele pra chamar de seu, as pessoas transformam tudo em mercado
Olha o que é uma pessoa que trabalha com a linguagem! Quando escrevi o texto, não pensei nisso que você pontuou, mas concordo com você. Também acho estranho o uso de “meu advogado”, “meu médico”, etc. Beijos =)
pois é… e eu fui muitas vezes questionada quando, na hora de ter alguma queixa na minha gravidez, não ter telefonado, mandado mensagem, ter procurado, como primeira opção “minha obstetra”. Se estou passando por uma situação de emergencia, eu não vou ficar esperando “meu médico” aparecer. Vou procurar algúm profisional qualificado que esteja disponível no momento para atender a emergencia (isso supondo que a gente tem disponibilidade de médicos qualificados em todos os centros de referencia e de atendimento de urgencia).
Eu pensei em fazer o meu parto com um plantonista, mas decidí no final fazer com a obstetra que acompanhou a gravidez toda pois ela estava 100% ao dia de todos os problemas de saúde que tinha e as inter ocorrencias da gravidez (a pessar que teria poupado uma boa grana hehe).
Passei já na minha vida por duas cesarianas. A segunda foi decidida depois de eu passar pela primeira, uma cesária de emergencia. Acredito que a decisão deve ser pessoal mesmo. Eu nunca me sentí capaz de enfrentar um parto normal (menos sabendo o peso estimado dos bebés que já carreguei, muito próximo dos 4 kg cada).
O primeiro parto foi uma correria, porque a equipe médica insistia em parto normal… aí eu pedindo cesária (em realidade anestesia, mas o pessoal me diz que interfere no trabalho de parto. E eu sentindo dor de contração, questionava eles sobre a existencia de equipamentos com a capacidade de detectar contracções e que já tinha visto muito parto com anestesia acontecer normalmente… mas bom, vou parar com isso porque já fují do tema inicial hehe).
Mas é isso, as pessoas precisam aprender e entender que não é porque pagamos por um serviço somos “donos” da pessoa que está nos prestando este serviço. E esta pessoa pode no estar disponível o tempo todo para você, pois você não é o único paciente dela, além de que aquele profissional, “teu médico”, tem vida não profissional e pode não estar disponível no momento em que você mais precise dele.
Ola Viviana, que alegria ver seu comentário aqui.
Esses relatos enriquecem muito essa discussão. Acredito que nós mulheres podemos nos sentir acolhidas e representadas quando lemos os relatos umas das outras. Claro que cada parto é diferente e cada mulher é diferente, mas há a possibilidade de se identificar com os relatos, nem que apenas por parte deles.
A decisão pelo tipo de parto a se ter é sempre difícil. Envolvem muitas questões: depende da nossa saúde, tamanho do bebê, nosso posicionamento, posicionamento da equipe médica, etc. Uma coisa que entendi é que parto de sucesso é aquele em que a mamãe e o bebê ficam bem.
E eu concordo totalmente com você: se estamos passando por uma situação de emergência ou desconforto mesmo, o ideal é mandar uma mensagem para a obstetra ou ir direto a uma plantonista? Eu sempre voto pela plantonista, sabe-se la quando a médica vai poder atender! Eu fiz meu pré-natal com uma médica pouco receptiva, apesar de competente. Eu sabia que contar com ela em situação de emergência era frustração na certa.
E no seu comentário, me marcou a seguinte frase:
“Mas é isso, as pessoas precisam aprender e entender que não é porque pagamos por um serviço somos “donos” da pessoa que está nos prestando este serviço.”
Nossa, concordo totalmente. Você já está há alguns anos no Brasil e deve ter notado que de modo geral a classe média tem essa ideia de ser proprietária de alguns prestadores de serviço. Enfim, a gente tem que levar a vida com critério e com respeito ao trabalho do outro e a vida do outro de modo geral.
Obrigada pelo comentário! Abraços e que Deus abençoe você e toda sua família linda.