
Muitos esperam ansiosamente pela Copa do Mundo. Eu já fui mais desesperada por Copa, principalmente na minha infância. Hoje fico mais tranquila, mas claro que o coração de torcedora bate forte quando acompanho um lance bonito. Eu acredito também que a Copa do Mundo (assim como os Jogos Olímpicos) são uma oportunidade para aprendermos mais sobre outros países e outras culturas.
Vários programas de TV tem focado na cultura da Rússia, país sede da Copa do Mundo 2018. Vi programas de TV falarem da gastronomia, costumes, similaridades com a cultura brasileira, o frio intenso no inverno, etc. E já que mencionei o frio e esse é o Meteorópole, vamos falar sobre o clima na Rússia. E eu não falo do clima de festa, claro. Esse é o Meteorópole e vamos falar de clima clima mesmo.
País enorme – gigantesco
A Rússia é o maior país (área territorial) do mundo. Possui 17.075.400 km² em área e como comparação, o Brasil possui 8.516.000km². Sendo assim, a área da Rússia equivale a aproximadamente duas vezes a área do Brasil.
A circunferência de Plutão é 7.232 km. Como podemos ver, a Rússia é um país com uma grande extensão leste-oeste (o valor médio é de 9.000km). Ou seja, eu conseguiria “enrolar” o mapa da Rússia em Plutão tranquilamente e as bordas leste e oeste ainda ficariam parcialmente sobrepostas. Se a gente calcular a área da superfície de Plutão (cerca de 16.600.000 km²) e comparar com a área da Rússia (17.075.400 km²), vemos mais uma vez que a Rússia é maior do que este planeta anão.

Eu fiz questão de ressaltar a enorme área territorial da Rússia porque dessa maneira fica fácil imaginarmos que é um país muito diverso em todos os aspectos: culturalmente, geograficamente, etnicamente, etc. É um país com vários tipos de ecossistemas, tipos variados de vegetação, ocupação do solo diversa, topografia variada, etc. E todos esses aspectos territoriais vão influenciar nos tipos de climas que encontramos na Rússia.
Onde vão ocorrer os jogos?
Os jogos da Copa do Mundo de 2018 na Rússia vão ocorrer em 11 cidades, todas na parte mais a leste da Rússia. Não necessariamente somente na parte européia da Rússia, como veremos na lista abaixo:
- Moscou
- São Petesburgo
- Sochi
- Kazan/Cazã
- Samara
- Rostov
- Níjni Novgorod
- Volgogrado
- Saransk
- Calinigrado
- Ecaterimburgo
Coloquei todas as cidades no mapa abaixo e veja que interessante: Calinigrado faz parte da Rússia, porém a província fica entre a Lituânia e a Polônia.
Olhando o macro: Classificação Köppen-Geiger
Vamos mostrar o mapa com a classificação Köppen-Geiger para termos uma ideia de onde as cidades onde ocorrerão os jogos se localizam dentro dessa classificação:

A cidade mais ao norte na lista é a cidade de São Petersburgo, mas ainda assim, se observarmos, quase todas as cidades onde teremos os jogos da Copa do Mundo de 2018 estão dentro da classificação maior Clima Continental Úmido (que engloba as siglas Dfa, Dfb, Dwa e Dwb), com exceção de Sochi. O Clima Continental Úmido caracteriza-se por ter temperatura média do ar no mês mais frio inferior a -3°C e no mês mais quente, superior a 10°C. O Clima Continental Úmido é um clima com ausência de estação seca, ou seja, a precipitação é bem distribuída ao longo dos meses do ano.
A cidade mais ao sul na lista é a cidade de Sochi, que é conhecida como a Riviera Russa. Fica as margens do Mar Negro e é um balneário, um destino de verão de muitos russos. A Seleção Brasileira inclusive está em Sochi, cidade escolhida provavelmente por ser mais parecida com boa parte do Brasil. Em Sochi, o clima já é considerado Sutropical Úmido (Cfa) e veremos adiante que é uma cidade mais chuvosa que as demais (e mais quente também). O Clima Subtropical Úmido engloba as siglas Cfa e Cwa da Classificação de Köppen-Geiger e as temperaturas médias nos meses mais frios ficam entre 0°C e 18°C e no mês mais quente fica em torno de 22°C ou maior. O termo Clima Subtropical Úmido não é utilizado por Köppen-Geiger, tendo sido emprestado da Classificação Climática de Trewartha apenas para comparação.
Se observarmos a Figura 3, veremos que a cidade de Sochi é a que possui maior precipitação média quando comparada com as demais cidades da Copa do Mundo 2018. No entanto, observando a precipitação média de todas as cidades (incluindo Sochi) vamos ver que não há uma estação seca e chuvosa definida (como temos em boa parte do Brasil, na Região Centro-Oeste e Região Sudeste principalmente, onde termos um regime bem monçônico: chuvas bem concentradas entre os meses de Setembro e Março e um período seco bem marcado entre Maio e Agosto). Em todas as cidades russas que participarão da Copa do Mundo 2018, temos precipitação bem distribuída ao longo do ano.

Temperatura de cidade por cidade
Fazer gráficos de temperatura para cidades russas foi uma grande novidade para mim. Achei bem estranho ver gráficos com tantos valores negativos. Não é novidade para ninguém que é frio na Rússia. Os romanos, Napoleão e os alemães sabem muito bem disso. Viver na Rússia é desafiar o frio intenso, adaptar-se e eu imagino que para um brasileiro que decida morar lá, a adaptação deve ser bem difícil. Mesmo que esse brasileiro venha da Serra Catarinense, as temperaturas que podem chegar a -40°C são incomparáveis com qualquer coisa que tenhamos aqui.
Acho que seria bem difícil fazer uma Copa do Mundo na Rússia entre os meses de Dezembro e Fevereiro, mas felizmente o evento ocorre no meio do ano, quando é verão e as temperaturas são bem mais amenas. Na Copa do Mundo de 2014 no Brasil, por exemplo, alguns jogadores estrangeiros reclamaram do calor. Portanto levar em conta o conforto térmico dos atletas é muito importante nesse tipo de evento.
Esse negócio de clima e Copa do Mundo é algo que já vem sendo discutido a respeito da Copa do Mundo de 2022 por exemplo, que será no Qatar. No começo de 2014 divulguei uma notícia de que estavam cogitando realizar a Copa de 2022 entre os meses de novembro e janeiro, porque as temperaturas naquela região durante o verão (meio do ano) são muito elevadas (podendo chegar perto de 50°C) o que prejudica a saúde e até inviabiliza a prática de esportes ao ar livre. A Copa de 2022 no Qatar tem sido questionada, devido ao tamanho e a infraestrutura do país.
Mas vamos voltar a falar da Copa do Mundo de 2018 na Rússia. Eu fiz 11 gráficos de temperatura média, média máxima, média mínima e extremos (máxima e mínima registrada), um gráfico para cada cidade que sediará a Copa do Mundo de 2018.
- Moscou – Figura 4
- São Petersburgo – Figura 5
- Sochi – Figura 6
- Kazan/Cazã – Figura 7
- Samara – Figura 8
- Rostov – Figura 9
- Níjni Novgorod – Figura 10
- Volgogrado – Figura 11
- Saransk – Figura 12
- Calinigrado – Figura 13
- Ecaterimburgo – Figura 14
Com exceção de Sochi (Figura 6), notamos que as temperaturas médias mínimas para os meses de dezembro e janeiro ficam abaixo dos -10,0°C. Sochi é realmente a única cidade da lista com invernos menos rigorosos, com temperaturas médias mínimas acima de 0°C. Porém mesmo em Sochi foram registradas temperaturas mínimas absolutas bem baixas. Na figura 6, a gente observa que a menor temperatura registrada em Sochi para um mês de janeiro foi -13,7°C.
Por falar em Sochi, a cidade sediou os Jogos Olímpicos de Inverno de 2014 (ocorreram em fevereiro de 2014) e uma das questões era o clima de Sochi. E uma das preocupações na ocasião era justamente a falta de neve, apesar do evento ter ocorrido no final do inverno. Lembro que a imprensa ficou impressionada na época, porém é preciso considerar que Sochi é provavelmente a cidade russa com inverno mais ameno, conforme podemos constatar na Figura 6.
É interessante compararmos o inverno em São Petersburgo (Figura 5) com o inverno em Ecaterimburgo (Figura 14). Apesar de São Petersburgo estar localizada mais ao norte que Ecateriburgo, São Petersburgo está bem próximo ao Mar Báltico (recebe o calor dos mar, que é um reservatório de calor) e está praticamente no nível do mar. Já Ecaterimburgo é uma cidade bem continental e embora esteja a apenas 270m acima do nível do mar, a continentalidade faz com que Ecaterimburgo apresente um inverno mais rigoroso. A temperatura média mínima em São Petersburgo para janeiro é em torno de -10°C e já em Ecaterimburgo é mais próxima de -20°C (Figura 5 e Figura 14, respectivamente). Considerando todas as cidades da Copa de 2018, o recorde de menor temperatura é da cidade de Ecatrimburgo, com -46,7°C em um mês de dezembro (Figura 14).
E já que falamos de continentalidade, quando a gente olha para as cidades mais continentais da lista (Moscou – Figura 4, Kazan – Figura 7, Samara – figura 8, Nijni Novgorod – Figura 10, Volgogrado – Figura 11, Saransk – Figura 12 e Ecaterimburgo – Figura 14) a gente observa uma maior amplitude térmica anual (maior diferença entre as máximas e as mínimas anuais) do que as cidades mais próximas de mares. Em algumas dessas cidades, como Samara e Volgogrado (Figura 8 e Figura 11) a temperatura média máxima pode chegar bem perto dos 30°C nos meses de junho e julho. Ou seja, são cidades com um inverno bem rigoroso e com um verão ameno ou até mesmo quente. Inclusive nessas cidades mais continentais há registros de temperaturas máximas absolutas maiores que 38°C no verão. A maior temperatura máxima registrada, considerando essa lista de cidades, é de 42,7°C em um mês de agosto na cidade de Volgogrado.
Ou seja, pode fazer muito calor na Rússia e os jogadores poderão experimentar temperaturas acima dos 30°C. Talvez não tanto porque tecnicamente a copa ocorrerá entre o final da primavera e o início do verão, mas dias com temperaturas elevadas são esperados. Chuva também é esperada, uma vez que não há uma estação chuvosa bem definida.











Como são 11 gráficos para analisar, é evidente que eu não consegui esmiuçar todos os detalhes, porém creio que foi possível ter uma boa ideia do que podemos esperar do clima dessas localidades. Observe que aqui eu fiz uma análise climática, ou seja, eu fiz uma avaliação das médias climatológicas das cidades de interesse. O que certamente todos nós veremos ao longo da Copa do Mundo é a previsão do tempo para as cidades onde o Brasil irá jogar e a previsão do tempo, até para que os jogadores, imprensa e torcedores que frequentarão os estádios possam se programar para os dias dos jogos.
Em outras palavras: esse post não apresenta a previsão do tempo, mas sim uma análise do clima das cidades que sediarão a Copa do Mundo de 2018. Para entender mais, recomendo:
Consultando a previsão do tempo para os dias dos jogos
Russian meteorological service Roshydromet is providing weather forecasts and environmental information for the #WorldCup Partly cloudy, no rain forecast for opening match in Moscow tmw https://t.co/fnv0KldJqY pic.twitter.com/PzhVoyZr5M
— WMO | OMM (@WMO) June 13, 2018

O serviço meteorológico russo chama-se Roshydromet. Clicando no link é possível ver em inglês a previsão do tempo e a qualidade do ar de todas as cidades-sede da Copa do Mundo 2018.
Dicas de livros
Vou falar de um livro em português que é super recomendado para quem está iniciando seus estudos em Meteorologia. Meteorologia: noções básicas conta com um time de autores excelentes (Rita Yuri Ynoue, Michelle S. Reboita, Tércio Ambrizzi, Gyrlene A. M. da Silva), todos professores de cursos de Meteorologia de diversas regiões do Brasil.
Hoje, o jornal em qualquer mídia apresenta e explica a dinâmica meteorológica. Embora façam parte de um sistema complexo, os fenômenos meteorológicos são apresentados nesta obra de forma simples e didática, desde os conceitos básicos de composição e estrutura da atmosfera até a previsão do tempo e do clima e as mudanças climáticas. {x}
Agora, vou falar de outro livro que tem muito a ver com o tema desse post. É o Geografia Aplicada ao Turismo, livro escrito por vários autores com organização do Raphael de Carvalho Aranha e do Antônio José Teixeira Guerra.
A obra apresenta uma abordagem ampla e integradora das ciências sociais e ambientais, numa perspectiva interdisciplinar, evidenciando a aplicabilidade da climatologia, geologia, geomorfologia, biogeografia, cartografia, geopolítica e cultura no Turismo, auxiliando esses profissionais a planejarem suas atividades turísticas, em escalas locais e regionais.
Todos os autores do livro são especialistas nas suas áreas e já vêm trabalhando há bastante tempo nos temas que se propuseram a escrever. Os sete capítulos abordam questões cruciais para a boa formação de um profissional em Turismo e para aqueles formados em Geografia que também se interessam pelo tema.
A grande quantidade de fotos, ilustrações, tabelas e gráficos pode auxiliar os leitores a entender melhor essas questões. A bibliografia apresentada também possibilita aos leitores se aprofundar em algum tema abordado no livro. O livro Geografia aplicada ao turismo pretende atender tanto a alunos de graduação como de pós-graduação em Turismo, Geografia e áreas afins, bem como a outros profissionais e ao público em geral interessado nessa temática. {x}
Geografia Aplicada ao Turismo é um livro muito indicado para profissionais da área do Turismo e Geografia. Se você viaja bastante, também é super recomendado! Confira!
E preciso indicar também dois livros de Climatologia, matéria essencial nos cursos de Geografia e Meteorologia (embora com abordagens diferentes). Indico Climatologia Fácil, de Ercília Torres Steinke. De acordo com o texto de divulgação:
O que faz a asa-delta voar? O que é o fenômeno El Niño? Como são formados os desertos? Qual a diferença entre furacão e tornado? Perguntas cotidianas, feitas por alunos e reunidas pela autora durante seus mais de 15 anos de experiência no ensino de Climatologia, servem como ponto de partida para explicar conceitos e fenômenos climáticos de forma prática e original.
Ricamente ilustrada, a obra utiliza exemplos práticos para explicar os principais conceitos da Climatologia Geral, como movimentos de rotação e translação da Terra, radiação solar, umidade, precipitação e circulação atmosférica. Ao final do livro, a autora discute o aquecimento global e as polêmicas que o envolvem, levando o leitor a refletir sobre esse importante tema.Climatologia fácil é uma referência prática e descomplicada para alunos de graduação em Geografia e Meteorologia e professores de ensino fundamental e médio, assim como todos aqueles interessados em conhecer mais sobre os fenômenos climáticos a partir de exemplos do nosso dia a dia. {x}
O próximo livro de Climatologia é o Climatologia: noções básicas e climas do Brasil. Os autores são Francisco Mendonça e Inês Moresco Danni-Oliveira. De acordo com o texto de divulgação:
Climatologia: noções básicas e climas do Brasil é uma obra de referência que reúne conceitos básicos de climatologia e meteorologia, com destaque para os domínios climáticos e sistemas atmosféricos que regem tempo e climas do continente sul-americano e Brasil.
Ao longo de sete capítulos, o livro traz um panorama sobre o clima e define didaticamente as diferenças entre climatologia e meteorologia. Iniciando com o ambiente onde ocorrem os fenômenos, analisa as propriedades da camada atmosférica com 10km de altura em torno da Terra e sua circulação. Mostra a dinâmica determinada por massas e frentes de ar na América do Sul.
O livro resgata o papel histórico das classificações, discute os modelos de classificação climática da Terra e apresenta os grandes domínios climáticos. Analisando as variações de temperatura e pluviometria ao longo dos anos, nas diversas regiões do País, define e apresenta os tipos climáticos do Brasil.
O livro reserva um capítulo final para falar sobre efeito estufa, desertificação, El Niño e La Niña, associados às mudanças climáticas globais.
Francisco de Assis Mendonça é mestre em Geografia Física, doutor em Clima e Planejamento Urbano. Atualmente é professor titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pesquisador do CNPq, consultor da CAPES e FAPESC. É professor colaborador do mestrado em várias universidades do País. Atua nas áreas de climatologia, epistemologia da geografia, ambiente urbano e geografia da saúde.
Inês Moresco Danni-Oliveira é mestre e doutora em Geografia Física. Atualmente é professora adjunta da UFPR. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Climatologia Geográfica, atuando principalmente em clima urbano, poluição do ar e saúde, acidentes climáticos, impactos socioambientais e variabilidade climática. {x}
Vocês já sabem: todos os livros da Oficina de Textos comprados a partir dos links no Meteorópole vão me gerar uma pequena comissão. Enriqueça sua biblioteca e ajude a manter o blog!
Bibliografia
- Pontos extremos da Rússia
- Geografia da Russia
- Rússia
- Yekaterinburg
- Kaliningrad
- Saransk
- Volgograd
- Nizhny Novgorod
- Rostov
- Samara
- Kazan
- Sochi
- Saint Petersburg
- Moscow
[…] Quase todas as cidades-sede encontram-se na região de Clima Continental Úmido. Ele é caracterizado por temperaturas médias inferiores a -3°C no mês mais frio e superior a 10°C no mês mais quente, com ausência de estação seca – a chuva é bem distribuída ao longo do ano. A exceção é a cidade mais ao sul: Sochi. Localizada às margens do Mar Negro, é um balneário de clima Sutropical Úmido, com temperaturas maiores e chuvas mais expressivas ao longo de todo o ano. (Fonte: Meteorópole) […]