
Recebi uma mensagem do Flávio, que fez uma pergunta bastante interessante. A pergunta dele me fez pesquisar e ler vários textos (vou colocar os links da maioria deles abaixo) e eu sempre agradeço por isso. Abaixo, a mensagem do Flávio:
Tomei contato com seu excelente site. Neto de italianos, trabalhei no mar e não deu outra, tive câncer de pele, retirado a tempo. Desde esse fato sou um divulgador desse assunto, não perco uma oportunidade de conscientizar meus alunos. Sou geógrafo, professor e empresário.
Minha questão é sobre essa última atividade, pois tenho uma pequena rede-franquia de estética automotiva. Pode indicar qual a radiação que realmente queima a pintura dos carros? Muitas vezes a efeito prisma das gotas de orvalho fazem isso, mas, em locais secos também se dá esse problema.
Agradeço antecipadamente a atenção.
Em primeiro lugar, agradeço por sua mensagem, Flávi0. E também agradeço por compartilhar sua história com o câncer de pele. Que bom que houve um final feliz e que você removeu a lesão a tempo e tornou-se um divulgador do assunto. Eu já escrevi vários posts sobre o assunto e acredito que como educadora e divulgadora científica é preciso falar sobre isso. Um dos posts completos sobre o tema é esse, leiam e compartilhem!
Agora vamos falar de carros.
É bastante comum a gente ver carros que ficam ao relento com a pintura meio “apagada”, um tanto opaca. Meu sogro mesmo tem um carro assim, bem velhinho e que ele usava para trabalhar e deixou ao relento por muito tempo. E sim, é a radiação solar faz isso. Se você já viu algum carro nessas condições, deve ter reparado que a parte mais manchada consiste principalmente no capô e no na parte de cima do carro, que são as que ficam mais expostas ao Sol mais forte (que é quando o Sol está mais alto, ou seja, entre 10h-16h aproximadamente, dependendo da época do ano e da latitude que você se encontra).
O principal responsável por danificar a pintura do seu carro são os raios UV (ultra-violeta), os mesmos raios que prejudicam nossa pele. Os raios UV não são parte do que chamamos de luz visível (as cores) do espectro eletromagnético. Os raios UV interagem com a matéria no nível molecular, pois possuem comprimento de onda muito pequeno (leia mais aqui). Quando a tinta do carro recebe luz UV, recebe muita energia. Boa parte dessa energia via calor, porém uma parte danifica a tinta no nível molecular.
Com o passar do tempo, quando esse processo acontece com uma grande quantidade de moléculas da tinta que cobre o carro, a camada de tinta como um todo passa a não interagir mais com a luz da mesma maneira, pois torna-se menos reflexiva e mais opaca, transmitindo menos luz para fora do que vemos como cor.
Algumas cores parecem ser mais afetadas por esse processo. E para entender o porquê disso, primeiro temos que entender que a luz vem em um espectro de comprimentos de onda (o espectro eletromagnético), e como um material absorve e reflete esses comprimentos de onda determina a cor que percebemos.
Cada cor tem um comprimento de onda específico e uma tinta de uma determinada cor é projetada para absorver todos os comprimentos de onda, exceto aqueles associados à sua mistura de cores. Então tinta vermelha absorve todos os comprimentos de onda, exceto aqueles na faixa vermelha, que são refletidos. Nós absorvemos essa luz refletida, e se não formos cegos, nossos olhos e cérebro se combinam para entender essa luz como vermelha.
E eu mencionei a cor vermelha propositalmente. Vocês já notaram que são justamente os carros vermelhos que ficam mais desbotados? Isso ocorre porque os comprimentos de onda associados ao vermelho são a energia mais baixa da luz visível, então, para parecer vermelho, ele absorve comprimentos de onda muito mais enérgicos, o que causa uma degradação mais agressiva das ligações moleculares da tinta.
Carros azuis por exemplo, de um modo geral, se degradam menos, porque os comprimentos de onda associados ao azul são a energia mais alta da luz visível. Para parecer azul, ele absorve comprimentos de onda menos energéticos, o que causa uma degradação mais lenta do que quando comparamos com outras cores.
E claro que isso também vai depender do tipo de tinta, pois algumas possuem um tipo de proteção contra o UV ou possuem características que desaceleram essa degradação. Esses detalhes técnicos sobre tipos de tintas eu deixo para quem entende do assunto, mas o ideal é sempre lermos os rótulos dos produtos para aprendermos mais a respeito deles.
Pelo o que pesquisei, não há maneira de reverter esse tipo de dano. Uma vez danificado, é necessário procurar um funileiro especializado para pintar seu carro na cor original. Carros brancos são menos sujeitos a esse tipo de dano, porque ele reflete todos os comprimentos de onda e reflete parte do UV. Provavelmente é por isso que carros de frotas de empresas na maioria das vezes são brancos.
Como não é possível reverter o dano sem pintar o carro novamente, o ideal é a proteção. O melhor é sempre manter o veículo em um estacionamento coberto, mas muitas vezes precisamos estacionar ao ar livre. Para proteger a pintura do seu carro, especialistas dão as seguintes dicas:
- Mantenha o carro limpo: lavando-o regularmente, você reduz a acumulação de substâncias como poluição e sal na camada de pintura, o que também pode acelerar o desbotamento.
- Coloque um filme de proteção: eu já ouvi falar do processo de cristalização, você pode encerar também, etc. Alguns desses processos podem ajudar a minimizar o dano, leia os rótulos dos produtos que você pretende aplicar.
- Seque o carro depois de lavá-lo: como o próprio Flávio mencionou, gotículas de água podem agir como lentes e potencializar o dano à pintura do veículo.
Flávio, se você tiver algo a acrescentar ou corrigir, alguma informação técnica, fique a vontade. Obrigada pela excelente pergunta!
Referências
- Superior Sun Solutions
- Your Car’s Paint Can Be Damaged by the Sun – 3 Ways to Prevent It
- Sun-Damaged, Faded Car Paint a Constant Pain in Vegas
- How to Restore Faded & Oxidized Paint
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