Hoje vou falar sobre névoa e sobre como esse fenômeno prejudica a visibilidade. A névoa (que pode ser névoa seca ou névoa úmida) se apresenta com um aspecto menos denso do que a neblina (neblina, nevoeiro e cerração são sinônimos).
Eu trabalhei por 10 anos na Estação Meteorológica do IAG-USP e lá nós usávamos definições que levavam em conta a visibilidade horizontal e a umidade relativa para diferenciarmos entre névoa úmida (que lá chamávamos de nevoento), névoa seca e neblina.
Pois bem, se a umidade relativa estivesse abaixo dos 70% e a visibilidade horizontal estivesse numa faixa menor do que 3000m, nós classificávamos como névoa seca. Se a visibilidade estivesse entre 3000m e 10000m, classificávamos como nevoado.
Por outro lado, se a umidade relativa estivesse acima dos 70%, poderíamos ter neblina ou névoa úmida. Para neblina, a umidade relativa deveria estar acima dos 70% e a visibilidade deveria ser de no máximo 3000m. Se a visibilidade horizontal estivesse entre 3000m e 10000m, teríamos então o nevoento (névoa úmida).
Observe que as classificações acima eram usadas na Estação Meteorológica do IAG-USP no período em que trabalhei lá (e acredito que até o momento ainda são usadas).
Agora que temos essas definições técnicas, vamos dar mais detalhes. Podemos então dizer que a névoa úmida (nevoento) é um nevoeiro bem fraquinho que não chega a causar prejuízos significativos na visibilidade (fechar um aeroporto, por exemplo). O vapor d’água se condensa nos aerossóis, o horizonte fica meio “embaçadinho” e a umidade relativa fica bem alta. Isso é bem comum em dias bastante nublados ou pouco antes de cair uma chuva intensa.
Em inglês, temos as palavras wet haze ou mist (névoa úmida) e o termo haze sozinho normalmente está associado com névoa seca. Normalmente, wet haze tem relação com poluição, quando poluentes atmosféricos (atividade humana ou vulcânica) que tem afinidade com a água atuam como núcleos de condensação. Já o termo mist tem mais relação com um fenômeno de atmosfera limpa (sem poluentes) e muitas vezes é usado como sinônimo do termo fog (neblina).

Lá na Estação Meteorológica do IAG-USP a gente não separava se a névoa úmida era resultado da atividade humana ou era natural. Na verdade não tem como saber apenas olhando (a gente apenas deduz). São necessárias coletas do material (existem equipamentos que coletam amostras de nuvens) para determinarmos a origem dos aerossóis.
Normalmente, a névoa úmida tende a deixar a área próxima do disco solar mais acinzentada ou azulada. Já a névoa seca tende a deixar a área em torno do Sol mais amarronzada ou alaranjada (um aspecto de sujeira). Isso tem a ver com o tamanho dos aerossóis. Dependendo do tamanho do aerossol, ele vai espalhar a luz solar mais preferencialmente em uma faixa de cores do espectro eletromagnético. Partículas pequenas tendem a deixar o céu mais puxado para o azul, enquanto partículas maiores tendem a deixar o céu mais puxado para o alaranjado (leia em detalhes aqui).
Quando há névoa seca, temos muitas partículas em suspensão e pouco vapor d’água para se condensar em todas elas. O que temos então é uma mistura de gotinhas d’água com partículas de poeira. Quando a gente tem névoa seca, normalmente não há nenhuma nuvem no céu (ou são muito poucas, acima da camada de sujeira céu está limpinho). O ar está bem seco e a gente só vê aquela baita camada de sujeira. Isso acontece bastante em São Paulo-SP durante a estação seca, quando os poluentes atmosféricos ficam aprisionados devido a uma inversão térmica que atua como uma “tampa” na atmosfera. Em situações assim, se você subir em um prédio lá na Avenida Paulista e olhar para o horizonte, vai ver uma faixa marrom de sujeira. Inclusive pilotos de helicópteros que prestam serviço para redes de televisão sempre mencionam o fenômeno quando o observam.

Névoa seca e névoa úmida não são nuvens, nós não os classificamos dessa forma, embora a névoa úmida pode aparecer misturada com nuvens Stratus ou ter sua definição um pouco misturada com a definição de nevoeiro (que é uma nuvem Stratus baixa). Estou falando isso porque com o clima “apocalíptico” que surgiu durante a tarde escura em São Paulo ontem, muita gente começou a enxergar fumaça onde provavelmente não havia ou ao menos não com a densidade que se imagina. Próximo aos focos de queimada, realmente há muita fumaça e os moradores podem de fato vê-la, inclusive eles sabem quais pontos estão sendo queimados. A fumaça das queimadas da Região Norte e Centro-Oeste podem ser transportadas para a Região Sudeste, pois como já mencionei em outros posts, a Cordilheira dos Andes permite essa canalização do fluxo de ar. Essa fumaça chega até aqui já bastante espalhada, diluída em meio a atmosfera, mas mesmo assim as partículas da fumaça podem colaborar no desenvolvimento das nuvens aqui. No entanto, essa fumaça não chega até aqui do mesmo jeito que está lá na região dos focos de incêndio.
É até por isso que eu estou bastante cética com relação a essa notícia, na qual moradores de São Paulo teriam coletado uma ‘chuva preta’ durante a tarde de 19/08/2019. Eu acredito que a chuva preta pode até acontecer, mas eu acredito que teria mais a ver com uma questão local (calhas empoeiradas e sujas depois de tanto tempo sem chover, uma fonte de poluição local – como uma fábrica local, etc). Estou aguardando mais informações sobre isso antes de escrever um post a respeito. No caso de uma erupção vulcânica de grande porte, pode realmente chover uma “chuva preta” a uma distância de até mais de 15km do vulcão, como nesse caso de 2018 do Vulcão de Fogo, na Guatemala). Bom, mas isso seria assunto para outro post, vamos aguardar mais informações.
Espero que vocês tenham entendido a diferença entre névoa seca e névoa úmida. Se alguma dúvida ficou, deixe anotada na caixa de comentários.
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