“Quando a gente lhes fala de um novo amigo, elas jamais se informam do essencial. Não perguntam nunca: “Qual é o som da sua voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que coleciona borboletas?” Mas
[O Pequeno Principe cap.IV] – Antoine de Saint-Exupéry
perguntam: “Qual é sua idade? Quantos irmãos ele tem? Quanto pesa? Quanto ganha seu pai?” Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos às pessoas grandes: “Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas no telhado…” elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma idéia da casa. É preciso dizer-lhes: “Vi uma casa de seiscentos contos”. Então elas exclamam: “Que beleza!” “
A famosa citação acima, de Antoine de Saint-Exupery em O Pequeno Príncipe voltou a minha memória recentemente, quando comecei a fazer um balanço sobre algumas interações sociais que já tive com pessoas que já tem filhos adultos. Essas pessoas fazem questão de dizer em qual faculdade o filho se formou, onde trabalham, o bairro onde moram, etc. Se o filho é médico ou advogado, essas pessoas fazem questão de reforçar isso com a boca cheia.
Nem sempre são os pais. As vezes são os tios, padrinhos ou qualquer outro parente mais velho. “Nossa, fulano está bem“. Pode ter certeza que tem cheiro grana por trás de fulano está bem. Fulano muitas vezes nem está nadando na caixa forte junto com Tio Patinhas, mas se ele consegue convencer bem, já serve.
Eu tenho refletido muito sobre o valor o ser humano. Falei um pouco sobre isso num zip do Teolabcast. Desde que saí do mercado de trabalho convencional, tenho feito muitas reflexões semelhantes, pensando muito a respeito daquilo que somos. Você consegue se descrever sem mencionar sua profissão ou seu local de trabalho? Para a maioria das pessoas aqui no Brasil, perguntar o quanto se ganha é considerado deselegante, grosseiro. Porém quando você diz a profissão e onde trabalha as pessoas podem inferir algumas coisas, no final dá no mesmo.
Você consegue se descrever sem falar a respeito de suas atividades econômicas? Quem você é? O que te faz ter valor e dignidade? Vejam, no momento minha ocupação principal é a de dona de casa e mãe. São trabalhos invisíveis pelos quais algumas feministas tem repulsa e muitos outros desvalorizam. Talvez haja quem questione meu diploma de Bacharelado em Meteorologia, como “algo que estou desperdiçando”, pois para ficar em casa não é necessário saber nada. Eu já pensei assim, mais ou menos assim, há muitos anos. Hoje percebo como era ignorante e extremamente injusta.
Eu queria que o normal fosse dizer que o filho está caminhando bem. Dizer que houve problemas, mas agora está melhorando. Que ele está estudando o que gosta, se aperfeiçoando em um novo hobby. Queria que o normal fosse sentir aquele orgulho gostoso que a gente não precisa necessariamente compartilhar com alguém quando percebe que o filho é honesto, é carinhoso, tem uma autoestima legal, respeita ao próximo, sonha sonho bonitos, etc. Eu queria que fosse esse normal das crianças, como Saint-Exupéry coloca tão singelamente.
Estou lendo Christine, de Stephen King. No livro, Arnie tem pais intelectuais, professores universitários, que não querem que o filho desempenhe uma função técnica ou operacional, como parece ser o desejo ou a vocação dele. O rapaz vai trabalhar na construção civil num trabalho de verão e se matricula em disciplinas ligadas à mecânica de automóveis, mas os pais parecem não gostar disso. Porque essas funções técnicas, as quais você não precisa ter um curso superior, são desprezadas por eles. Sim, e tem gente demais que pensa desse jeito. Gente que se considera toda liberal e se julga livre de preconceitos, mas se ouve falar de curso técnico, começa um discurso enfurecido. E esse tipo de reação para mim mostra o quanto ainda atrelamos o valor das pessoas ao diploma que ela tem ou ao emprego que possuem.
Se um dia meus filhos lerem esse post, meus queridos, apenas quero que vocês ouçam e vivam a música a seguir:
Mama told me, when I was young
Come sit beside me, my only son
And listen closely to what I say
And if you do this it will help you some sunny day
Oh, yeahOh, take your time, don’t live too fast
Troubles will come, and they will pass
Go find a woman, and you’ll find love
And don’t forget, son, there is someone up aboveAnd be a simple kind of man
Oh, be something you love and understand
Baby, be a simple kind of man
Oh, won’t you do this for me, son
If you can?Forget your lust for the rich man’s gold
All that you need is in your soul
And you can do this, oh baby, if you try
All that I want for you, my son
Is to be satisfiedAnd be a simple kind of man
Oh, be something you love and understand
Baby, be a simple kind of man
Oh, won’t you do this for me, son
If you can?Boy, don’t you worry, you’ll find yourself
Follow your heart, and nothing else
And you can do this, oh baby, if you try
All that I want for you, my son
Is to be satisfiedAnd be a simple kind of man
Oh, be something you love and understand
Baby, be a simple kind of man
Oh, won’t you do this for me, son
If you can?Baby, be a simple, be a simple man
Simple man – Lynyrd Skynyrd
Oh, be something you love and understand
Baby, be a simple kind of man
Claro que uma das coisas que nós pais devemos proporcionar são condições para que os filhos consigam obter o pão nosso de cada dia. Mas é justo fazer uma competição ao transformar isso numa corrida alucinada, onde vale tudo? Reduzir seu filho ao número de Universidades em que ele foi aceito? Eu sinceramente não quero isso. Deus nos ajude a cuidar da saúde mental das crianças.
Imagem da capa: Unsplash
Radar Meteorópole
- Se você é professor ou tutor EaD, sugiro esse texto aqui que conta toda a história da Netiqueta. A ideia dele não é dar “dicas de netiqueta”, porque bem, acho que a essa altura pessoas razoáveis já sabem como isso funciona. O texto proporciona uma discussão muito interessante e conta a história do tema.
- Teolabcast sobre Consumismo e Cristianismo. Ficou muito legal.
- Playlist com as músicas citadas no livro Christine. Esse é o tipo de fã que um escritor merece.
- Saiba mais sobre o cometa Neowise
- Visite o Habeas Mentem para conhecer mais sobre a história sergipana.
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