Estava caminhando com meu filho mais novo quando uma florzinha roxa, que parecia um sino e tinha um 2cm de diâmetro chamou minha atenção. Nós nos abaixamos para observar melhor e pude notar que a florzinha crescia em ramos e tinha toda a cara de trepadeira.

O local que estávamos era um campo sem sombra, com várias espécies pioneiras pois parte da área havia sido coberta por brita e um novo solo estava se formando por cima. Eu tirei algumas fotos da planta, dando ênfase na florzinha e no formato da folha, pois pretendia identificá-la quando chegasse em casa.

Dias antes eu tinha ido no mesmo local e observei apenas as flores. Havia outras plantas emaranhada na corda em que as flores crescem e eu estava olhando meu filho mais novo, então não consegui prestar atenção nas folhas que pareciam folhas de batata-doce (Ipomoea batatas). Na segunda vez fui determinada a olhar as folhas com cuidado e percebi uma coisa: minha hipótese inicial de que a florzinha fosse do gênero Thunbergia estava completamente errada e minha comparação mental com folhas de batata-doce vieram a calhar.
Eu até tinha falado da suposta “priminha da Thunbergia” nesse post. Errei mesmo!
Digitei a descrição da planta no Google, vi algumas fotos e foi quando finalmente identifiquei a planta como Ipomoea triloba, ou seja, ‘parente’ bem próxima da batata-doce (Ipomoea batatas).
Eu cheguei a cavar o solo para ver a raiz da plantinha e nada de batatinha! Já estava pensando que ia encontrar uma PANC (planta alimentícia não convencional), mas me frustrei.
Para vocês terem uma ideia, plantas do gênero Thunbergia e Ipomoea tem em comum apenas o fato de serem do mesmo clado (ambas são asterídeas). Quero dizer, elas não são nem da mesma família! A seguir, a classificação completa da Ipomoea triloba e da Thunbergia grandiflora apenas para comparação e visualização do que estou falando:
Thunbergia grandiflora | Ipomoea triloba | |
Reino | Plantae | Plantae |
Clado | Angiosperms | Angiosperms |
Clado | Eudicots | Eudicots |
Clado | Asterids | Asterids |
Clado | Lamiales | Solanales |
Família | Acanthaceae | Convolvulaceae |
Gênero | Thunbergia | Ipomoea |
Espécie | T. grandiflora | I. triloba |
Como botânica amadora, penso que esses enganos são muito comuns. Imagino que quem esteja tentando identificar nuvens (observador meteorológico amador) e chegou até meu blog com esta finalidade, também fica cheio de dúvidas (e espero que esteja conseguindo te ajudar). Quando queremos realmente aprender sobre algo, as coisas vão ficando cada vez mais enredadas e complexas, o que é fascinante,
Bom, e aqui aproveito para contar para vocês o nome popular da Ipomoea triloba: corda-de-viola. Como uma corda (e uma cordinha resistente) ela se embaraça na vegetação em seu entorno. E talvez por essa razão ela seja considerada um terror para as colheitadeiras. Encontrei esse artigo em que se discutia a eficiência do uso de herbicidas para controlar a corda-de-viola. Outro artigo discutia o mesmo assunto, porém considerando o uso do herbicida com palha de cana. Ela é considerada uma espécie infestante, pois atrapalha no uso da colheitadeira e retém a umidade no ambiente da lavoura, o que pode ser ruim para a espécie de interesse econômico (algumas pragas se desenvolvem melhor em ambientes úmidos, por exemplo).
A corda-de-viola é considerada, portanto, uma espécie infestante. Ela prejudica lavouras de arroz, amendoim, milho, soja, etc. Pelo o que entendi ela é um problema principalmente quando há colheitadeiras envolvidas, então pode não ser um grande problema em seu jardim ou horta (é preciso observar e ver como as plantas se comportam, claro).
Apesar de ser considerada uma espécie não-interessante, eu particularmente gostei muito das florzinhas. Pensei em seu potencial para ser usada como trepadeira, subindo em cercas ou mourões. E lembram que eu falei que ela é parecida com a batata-doce (são plantas do mesmo gênero). Pois bem, este artigo da Nature considera o potencial da I. triloba para melhorar o genoma da I. batatas, deixando-a mais resistente (veja aqui). O artigo também essa imagem que achei bastante interessante, que compara as raízes e flores da I. batatas, da I. triloba e da I. trifida (outra espécie do mesmo gênero botânico que o artigo avalia). Pois bem, a foto mostra realmente o que vi em campo: a raiz da I. triloba não é nem um pouco gordinha, hahaha.
Como vocês provavelmente puderam notar, essa plantinha me ensinou algumas coisas sobre Botânica e eu fico muito contente em poder compartilhá-las por aqui. Quando estudamos essas espécies que as pessoas em geral desprezam, chamam de “mato”, descobrimos muitas coisas interessantes. Fiquei pensando numa comparação com animais. Muita gente detesta insetos e até gostaria que eles não existissem. Com as espécies pioneiras e com as espécies infestantes ou daninhas, creio que há um pensamento similar: o de que essas plantas não servem pra nada. Esse tipo de raciocínio ajuda a justificar a impermeabilização do solo, por exemplo. As plantas são interessantes apenas em jardins ou hortas completamente ordenados, com espécies já conhecidas e cultivadas há muito tempo e que muitas vezes não se adaptam bem àquele bioma. Cada forma de vida tem o seu papel no ecossistema e quando sua população fica descontrolada, é porque há algum desequilíbrio no local que precisa ser visto com cuidado.
Radar Meteorópole
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- O Vinícius deu uma dica de documentário que vou começar a assistir assim que terminar de editar esse post. Trata-se de um documentário sobre o fenômeno Morning Glory (Stratocumulus volutus) em uma região especifica da Austrália. Eu falei sobre Morning Glory aqui nesse post também.
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